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segunda-feira, 18 de dezembro de 2017

Quem mente, Meleng-Kalil?


Tem, tem, tem, tem, tem... Martelo sobe, martelo desce... Xiiiiiiiiii! O metal chora... O canto dos ferreiros. Os olhos do goblin se arregalam antes de Azgher trazer o dia. Como galhos de uma floresta seca e vermelha - uma área de Tormenta? -, lugar que nunca foi, os olhos de Meleng-Kalil são esfregados por suas mãos sujas e calejadas. Há muitas encomendas! Dispositivos de medição das horas, aparatos para guardar tibares de maneira segura, lentes de longo e curto alcance etc. Enquanto ajeita um breve erro aqui ali, acidentalmente ou não cometido, o pequeno verde aprende rapidamente sobre tantas coisas de tantos lugares diferentes, aos poucos estuda muitas línguas, há inscrições, runas e outros símbolos variados em muitos objetos! Mas deveria partir cedo, em direção a um vila onde um rico comerciante lhe fizera uma proposta irrecusável.
Ele foi parar sem querer no Deserto da Perdição. Sua mãe estava com o pequeno na barriga quando se aventurou ao lado de dois guerreiros anões, uma feiticeira halfling e um bárbaro goblin, seu pai. A "Tropa dos Titânicos", como eram conhecidos, se aventurara em diversas partes de Arton, principalmente nos ermos distantes das grandes cidades, e ganhara notoriedade em algumas poucas vilas. Ninguém nunca soube o que fez aquele grupo se unir, o certo que já cavalgavam há muitas aventuras juntos: roubaram o olho de vidro de um clérigo de Khalmyr, encomenda de um velho ladrão já sem forças, derrotaram uma hidra que atacara um vilarejo de pastores e pescadores, ajudaram a destituir um barão corrupto e cruel, resgataram uma jovem elfa-do-mar levada por circenses sem dignidade etc. No meio de todas essas jornadas, o amor da ladina e do bárbaro floresceu... Mas um ataque de beduínos com olhos de serpente levou a vida do bravo grupo, os salteadores usavam armas feitas com veneno mágico e mortal. A ladina Kashykhala foi a única sobrevivente, mas fora ferida, tivera que forçar a saída do filho do seu ventre - cortou o próprio tórax e carregou o pequeno por uma longa distância no deserto até encontrar um viajante que pudesse levar o filho em segurança para algumas das muitas tribos dali. E assim ele o fez. Enterrou a goblin ali mesmo.
Saah'Pari'Pahn não era exatamente como um pai para Meleng-Kalil, era mais ou menos como um dono, o nome dele fora escolhido por acidente, tivera um cão muito estimado que se chamara Kalil, e às vezes se pegava chamando o pequeno verdinho assim, também tivera um escravo que lhe dera muito trabalho, roubava dos outros e era muito ardil, tivera o nome de Meleng - o senhor Saah'Pari'Pahn o trocara por três camelos sadios depois de pouco tempo de convivência - e vez ou outra, o velho agricultor do deserto chamava o goblin assim. A junção foi natural.
Numa viagem à vila de alguns poucos parentes do comerciante que adotara aquela criatura cor de safira opaca, uma tempestade de areia os flagelou, o velho nunca fora um aventureiro e temeu pela vida dos camelos e do pequeno! Ele começou a rezar para Azgher com todas as forças, mas em meio aquele caos de areia escaldante, ele tivera certeza de ter visto rostos em meio a tempestade, o som de línguas que sussurravam promessas dolorosas, olhos terríveis e brilhantes... Quando a tempestade passou, Meleng-Kalil levantara entre os três camelos mortos e nunca mais encontrara Saah'Pari'Pahn. Ele chorou por um breve momento e voltou para a aldeia.
Na aldeia, contara a todos o que ocorrera, os homens lamentaram e alguns até mesmo lhe ofereceram orações de conforto. Uma semana depois, o goblin já não era tão bem quisto. Uma semana antes, era filho de um agricultor que viajava longas distâncias para vender grãos e legumes que cultivava em vasos, sempre com preços possíveis de serem pagos. Entretanto, agora, era apenas um goblin resmungão sem trabalho, bebendo e perturbando. Quando o dinheiro acabou, Meleng-Kalil começou a pedir, e depois de muitos nãos, alguém lhe bradou: "Faça por merecer, inútil!". Então, ele lembrara o que seu protetor lhe dizia sobre goblins, que eram bons para consertar qualquer coisa, mas isso era só algo dito e não provado a ele, afinal ele vira apenas uma vez outro igual a si - e estava em exibição numa gaiola - não sabia muito bem o que sua raça poderia fazer por aquele mundo. Então, começou a tentar. Uma semana comendo restos aguçou sua mente, e ao observar um cofre quebrado em sua casa, algum pagamento alternativo feito ao pai, o desmontou, remontar levou mais uma semana, e consertá-lo mais um mês.
Hoje, viaja de vila em vila oferecendo seus serviços para consertar coisas com algum valor àqueles que podem pagar, nem que seja por outras bugigangas estranhas de partes muitas vezes bem distantes dali.
Um dia, um rico comerciante chamado Gahlaal Ganduur precisou dos serviços de Meleng-Kalil para remendar um cordão de pedras preciosas que fora presente de noivado de sua filha do meio, Onisha Ganduur, era uma peça delicada e trabalho intrincado, pareciam nós feitos e pequenos fios de cobre e bronze com safiras e esmeraldas, realmente uma obra de arte. Meleng-Kalil possui um problema que também lhe auxiliava às vezes, sua mãe fora envenenada pouco antes de dar a luz a ele... Ele recebeu uma parte do veneno, o que afetou sua mente; havia um nível de confusão em sua cabeça, algumas situações eram bobas e triviais, contudo, outras eram razoavelmente perigosas. E Meleng-Kalil percebera que as coisas estavam frequentemente mais confusas com o passar do tempo: havia dias que ele não conseguia dormir, o tempo inteiro irritadiço, tendo que fazer alguma coisa, começava vários projetos, e quase não terminava nenhum! Era horrível, passava uma semana sem dormir, cada dia pior, então, exausto adormecia. Outras circunstâncias estava com uma preguiça terrível, mal se levantava pra comer, e sentia uma imensa aflição sem razão, trabalhava por uma semana inteira algumas poucas horas do dia, a maior parte do tempo bebia para dormir, não completava muitas encomendas.
Agora, na casa do comerciante mais rico daquela parte do Deserto da Perdição, ele estava diante de um trabalho que poderia lhe render dois ou três meses de descanso para trabalhar no seu projeto mais recente: a "cabana flutuante"... Houve apenas um problema, havia algo de errado com o tom daquelas joias, algo que ele não conseguia entende o porquê de lhe perturbar, era como se algo maligno e aterrador lhe observasse, pareciam olhos, seguidos de sussurros apavorantes que se misturam ao som de uma tempestade de areia. Ele lembrou.
O senhor Gahlaal o aguardara em seu pequeno palacete nas margens de um oásis. Um lugar maravilhoso e muito agradável, recebeu nos jardins o goblin, e lhe ofereceu uma bebida local, feita com seiva de cactos e capaz de deixar um homem bêbado em poucas doses, Meleng se conteve e bebeu pouco. Sobre a mesa de ferro estava a joia que não parava de encarar: dezessete pequenas pedras preciosas, uma verdes e outras azuladas. Duas estava soltas, uma de cada cor, e havia um nó que aos poucos iria romper a parte que se fechava entorno do pescoço da felizarda que a usaria. Kalil então perguntou se aquele objeto possuía muito tempo de fabricação, para cogitar se havia problema de desgaste ou ferrugem, assim poderia julgar se o artesão fora imprudente. O arrogante Gahlaal disse que não sabia, apenas tinha certeza do valor que aquilo possuía. Logo, ele deixou o goblin só para que trabalhasse em silencia e sem perturbação, se precisasse de algo, bastaria chamar algum dos empregados, Azgher ainda não havia alcançado seu ponto mais elevado, e por ora, Meleng-Kalil não precisava se apressar, entretanto, sua preocupação era outra alguém ali teria algum envolvimento com o desaparecimento de seu antigo tutor?

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