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quinta-feira, 31 de março de 2011

O arrependimento sufocado e a luxúria em pedaços; o fracasso.


Em 1950, o Brasil estava com tudo! O sambista não perdia um único jogo! Quando não gastara de seu próprio bolso, depois de ter limpado os dos mais distraídos, dava um jeito junto à portaria, uma ginga qualquer, e conseguia adentrar o monumental Coliseu brasileiro: o Maracanã. Tudo parecia mais saboroso com as proezas do Brasil em campo, mas como num arrebate violento, sem prévio aviso, desde do primeiro olhar, Rubens Alonso tinha certeza: tinha que ter Tereza Favacho. Ela era todo desejo do malandro: cheia em todos os espaços desejosos de seu corpo tentador. A malícia da mulata deixava o malandro de quatro - ele pensava nela quando deitava com outras. Ele imaginava o cheiro e o sabor da danada. Nenhuma arrebatara seu coração, será que aquela desgraçada tava laçando o capoeira devagar? Sem que ele percebesse?
As finais estavam próximas. Ele já conseguira segurar-lhe a mão e roubara-lhe um beijo. Agora queria ver: logo ela estaria em seu colchão. Logo estariam tão grudados que nem água fria os separaria, tudo pronto. Que venha a Espanha! Mas o trabalho apertou, ele vivia de bicos, então tinha que dá um nó no tempo pra ver sua mulata querida. Tereza se enchia de vaidade ao ver aquele malandro esguio se esforçando para roubar-lhe beijos na surdina das esquinas cariocas.
Em uma noite maliciosa, a lasciva se fez irremediável, ela seria dele, segredou-lhe o dia e o local na despedida; Rubens não podia acreditar. Conseguira enfim o objeto desejado, já podia até sentir o calor do corpo inteiro da moça junto ao seu. Ele suspirava ao imaginar. Grande desgraça maravilhosa! O Brasil chegara a final - seria campeão do mundo no Rio de Janeiro! Beberia, comemoraria ao lado da mulher que prometia ser de toda sua vida! Ele já vibrava ao imaginar em sua rede encardida durante a madrugada. Mas então ao acordar, quando os sonhos se vão arranhando-nos com unhas melancólicas, a terrível notícia o pasmou: a final do mundial seria no dia de sua final com Tereza. Desgraça para muita cachaça: no mesmo horário. Tereza! Que praga teriam lhe jogado, onde teriam enterrado o anfíbio agourento?! Agora deveria decidir: a final da Copa do Mundo ou a mulher de seus desejos - senhora de sua lasciva.
Bom malandro, capoeira como poucos, com a astúcia carioca, decidiu, em uma lógica inegável: Tereza sempre estaria ali a esperá-lo, uma final de Copa jamais! Ele comprara o ingresso antecipado, o que lhe dava maior certeza da decisão ingrata.
Um chute cruzado do uruguaio Ghiggia desgraçou sua vida entre os duzentos mil presentes e sabe-se lá a de quantos milhões espalhados por todos os cantos da nação. Bêbado, lembrou anos depois do ocorrido. Nunca mais viu a mulata, que dizem ter ido morar em Minas. Ele saiu calado, não tinha vontade de beber, mas o choro precisava de um empurrão pra sair. Perdera o que quisera? Tentou se arrepender, mas a tristeza era pela derrota que não deixa uma migalha de esperança para ser chorada. Não restara um único desejo.

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