De longe, veio de muito longe este pensamento, que a máquina transfere para o papel. Eu deveria estar deitado em uma cama, mas de fato não faço a mínima ideia de onde estou agora. Talvez o tato seja a própria gravidade, ou filho dela, ou o carcereiro que trabalha para ela, que seja. Eu imagino a máquina e penso nos meus dedos, e então escrevo. Mas não sei onde estou ou como estou. Há apenas uma cor - o preto. Eu via, ouvia, falava... Trabalhava e me preocupava, num dia tudo mudou; numa breve tarde, quando nem se pensa em contas para pagar ou deuses para rezar, o vidro do carro manchado, não é mais que a tela repetida da sua vida rotineira, nesse dia eu vi. Você já teve desejos, já olhou pervertidamente os fundos de uma mulher por baixo das saias! Sentiu uma satisfação, que nem uma excitação pode dar conta, quando da primeira vez fez isso, não foi? Ou uma decepção grande da ânsia estar na certeza da ausência? Não importa. Eu vi por baixo das pernas de uma coisa que atravessava o céu; e eu no carro parado. Por que olhei para cima? Meu filho me esperava para buscá-lo, eu cogitava a obrigação de amá-lo, por quê?
Aquilo simplesmente atravessou o céu inteiro em um passo, rasgando o azul daquela tarde que estava se acabando.
Eu nunca mais vi nada. Minha janela é minha imaginação. Devo ter caído, devem ter buzinado, perdi os sentidos? Me libertei deles? Devo ter urinado, defecado, espumado... Devem ter chorado? Meu filho, quem foi buscá-lo? Aquela conta atrasada... Os receios de minha esposa.
Sinto em uma infinidade tremenda, a certeza do que aquilo procurava, na vastidão oriunda da suposição, acho que o pai. Estaria indo abraçá-lo ou ocupar o seu lugar. Não! Estava vindo para cá; e o Medo e a Guerra o acompanhavam.
Estou livre.
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